sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

músicas do BTS como conceitos de Mark Fisher: sim, eu estou doida

Imagens reais de um simpósio sobre como BTS destruiu o pop imperialista. Universidade de Goldsmiths, Londres, 2022.


Desde que eu cai no buraco do BTS (gente, repito: que delícia! tô amando! motivo principal hehe), eu criei uma linha do tempo alternativa em que alguém mandou Cypher pt. 3 para o Mark Fisher e a tongue technology do Yoongi derreteu o cérebro dele e pronto! Ele entrou para a facção mais perigosa do multiverso: ARMY.

 

Com este cenário em mente, essa que vos escreve teve a brilhante ideia de lançar uma série de posts de música dos Bangtans e os conceitos correspondentes do nosso crítico favorito. 

De nada e desculpa!

Pra começo de conversa, vou argumentar porque Fisher poderia ser ARMY. 

Motivo 1: BTS enquanto mito. De underdog que virá pica das galáxias, indo contra o sistema (monopólio das três gravadoras gigantes do k-pop), eles mudaram o jogo completamente. Ou seja, é uma história de Superação de um bando de meninos completamente doidos, porém ambiciosos, com um desejo só: fazer a Revolução. kkkkk okay, fui meio longe, mas eu já tô meio que preparando vocês para esperar esse tom e besteiras desse tipo nos milhares de caracteres que vão ser despejados neste blógue.

Mito ou não, a história do bts é bem interessante: verdade que começaram em uma agência/gravadora independente* e agora é a boyband mais famosa do mundo, com a idade dos fans variando entre 8 e 80 anos. 

Motivo 2: a sinergia coletiva rizomática entre eles e ARMY, mostrando que nem sempre a multidão é perigosa, ao contrário da opinião de muitos demagogos por aí. Ou seja, há um exército todo a nossa disposição (gente, bora construir um movimento socialista com fãs de k-pop, não temos nada a perder a não ser nossos grilhões). 

Motivo 3: como um bom audiófilo, Fisher piraria com as músicas porque a paleta sonora híbrida vai de ambient/indie rondológico ("134340"), UK Garage ("Trivia: Just Dance"), passando por d&b ("I'm Fine"), old skool hip-hop (duh, músicas da rap line) e neo soul ("Singularity"). Nessa bagunça totalmente organizada tem até umas pitadas de ritmos e timbres latinos ("Blood, Sweat & Tears" e "Airplane pt. 2") e formas musicais tradicionais coreanas ("IDOL", "DDaeng", "Daechwita"). 

Ai, BTS é bom demais, pqp. 

Ah! Outra coisa que derreteria o coração do Fisher é o fato de eles terem sido considerados feios** quando debutaram e bregas por fazerem rap. Como o mundo dá voltas, não? (Tá tocando Cypher pt. 4 aqui).

Sem falar dessa campanha toda do Love Yourself que traria uma lágrima nos olhos do crítico inglês canceriano: "isso mesmo, o capital fala que a gente não serve pra nada, mas foda-se, amem a si mesmos!". Tá, eu pirei um pouco agora (de novo!), mas acho que ele compararia essa brisa com aquela atitude desafiadora mod de se vestir bem e praticar o auto-cuidado como estratégias anticapitalistas. 

Mas enfim. Continuando.

Fisher os acharia punk, e de fato, podemos traduzir BTS para o panteão punk se os considerarmos como um amálgama das principais tendências exemplificadas por bandas como Buzzcocks (melodias pop irresistíveis), The Jam/The Clash (consciência de classe e ódio de classe) e Sex Pistols (um grande foda-se para o complexo militar-industrial-de entretenimento). 

Especulando um pouco sobre, hmm, as preferências, acho que o bias dele seria o Suga, porque ele é tipo um Mark E. Smith*** versão idol (um dos heróis do Fisher) e o bias wrecker seria o J-hope, porque ninguém resiste a esse raio de sol (evidências: Outro: Ego e a mixtape Hope World, verdadeiras obras de arte). 

Yoongi mandando a real. Ele é um gostoso, né?

Mas no fundo, no fundo, como toda boa ARMY ele seria OT7. Ele adoraria, além do Suga e J-hope (FISHER FANFIQUEIRO SOPE BIASED):

  • A inteligência e o comprometimento ético do nosso idol comunista favorito, RM; 
  • a voz doce e sobrenatural da nossa femme fatale irresistível, Jimin; 
  • o disposição tranquila de tradição spinozista e a beleza etérea de Jin; 
  • o sorriso de coelhinho (Fisher estaria propenso a ser uma fangirl como qualquer uma de nós) e a voz arrepiante de Jungkook; 
  • e a irreverência excêntrica e dândi do V. 

Sobretudo, iria adorar os passos ninjiskianos que o grupo executa com tanta precisão e alegria e os sons delirantes de suas músicas.

O motivo subjacente a esse post, se já não tenha ficado claro, é: na real, tudo isso é uma homenagem a um pensador que ajudou a me formar e aos motivos atuais de minha alegria (O sorriso do Teteco BTS! BTS! BTS!).

Okay, uma nota sobre a metodologia: literalmente escutei as músicas e fucei nos escritos do Fisher. Só isso. Basicamente, vou combinar músicas do BTS que exemplificam os conceitos que considero mais interessantes, e sei lá, acho que dissertar um pouco sobre eles? 

Vamos ver se eu consigo porque eu ando completamente mais maluca do que o normal. 

Ah, usei essa "tabelinha" de guia:

créditos a @k_punk_unlife

O próximo post, por ser uma introdução, é sobre o conceito de modernismo pulp, que era o pilar do projeto teórico-estético do Fisher. Para os próximos (aviso: sujeito a alterações) quero falar sobre:

  • realismo capitalista (BTS destilando ódio de classe, sexy);
  • hauntology/assombrologia (spotlight no agust-d, uhul);
  • e desejo pós-capitalista (comunismo ácido! dissertação de 10.000 palavras sobre Telepathy! eba!). 

Vão ter alguns interlúdios com certeza, porque o tio Fisher era muito produtivo para criar conceitos, mas já fica o alerta de spoiler: vai ter post sobre músicas de amor (uwu), um ensaio sobre a escolha estética pelo hip-hop enquanto sonoridade e conceito principal do grupo, e posts especiais sobre cada membro da rap line (gente, vou tentar me segurar no do Namjoon, meu gêmeo e alma gêmea. Te amo, bro!).

Bom, só uma palhinha sobre o Mark Fisher antes. 

O que informava o senso crítico e estético do tio Mark era se o objeto, obra, etc. em questão (sempre considerado de maneira integral: forma e conteúdo articulados) rompia com o status quo. Se ele rasgasse o tecido da alienação e revelasse o sinistro e loucura subjacentes à realidade surreal produzida pelo hipercapitalismo. Em outras palavras, ele gostava é de desloucar a alienação de cada dia. 

Por isso, tal música, filme, série tinha que ser intenso e meticuloso, estranho e popular para cortar essa cortina de névoa. Porque era justamente isso o que tinha capturado sua atenção nos últimos anos de sua vida: como a gente vai sair dessa. Ou melhor, como podemos criar o desejo para o pós-capitalismo, criar um plano de vitória, ganhar o mundo

Como ele colocou de maneira bem eloquente, nós seres humanos somos todos "tortured monkeys in hell" e faz muito bem entender as causas desse sofrimento coletivo (spoiler: é o capitalismo, bicho!), inventar o futuro e sair de vez dessa bad generalizada.

Mas tem uma fofoquinha de bastidores que é a seguinte: o tio Mark se distraiu enquanto escrevia sobre o comunismo ácido com um outro projeto sobre canções de amor (por isso o interlúdio romântico uwu. Agora toca DNA, por favor!). 

Não é super coerente com o projeto estético do BTS? Não?! Espero convencer vocês com essa série.

Agora já deu, cansei. Próximo post sobre é sobre o modernismo pulp. 

Tchau! Tchau!



Bibliografia básica (todos estão disponíveis naquele site soviético russo bapho que ajuda, nós pobres e fudidos, a não dar dinheiro para as editoras fds capitalistas sem vergonha):

Capitalist Realism: Is There No Alternative?. Winchester: Zero Books, 2009. 

Ghosts of My Life: Writings on Depression, Hauntology and Lost Futures. Winchester: Zero Books, 2014. 

Post-Punk Then and Now (editor, with Gavin Butt and Kodwo Eshun). London: Repeater Books, 2016. 

The Weird and the Eerie. London: Repeater Books, 2017. 

k-punk: The Collected and Unpublished Writings of Mark Fisher (2004–2016) (edited by Darren Ambrose, foreword by Simon Reynolds). London: Repeater Books, 2018.

Postcapitalist Desire: The Final Lectures (edited and with an introduction by Matt Colquhoun). London: Repeater Books, 2020. 


*sim, tô ligada que a BigHit tinha subsídio do governo. Fisher amaria que o estado sul-coreano dá dinheiro para fomentar o soft power. era esse o comunismo que ele queria hahaha.

** pecado! mas quem ri por último, ri melhor: a visual line tem os dois caras considerados os mais lindos do mundo.

*** gente tudo conspira a favor do Fisher ARMY: Mark E. Smith era pisciano assim como o Yoongi! Mais evidências para o argumento, favor olhar isso aqui e isso aqui. Também acho que Daegu e Manchester tem a mesma vibe: como cidades polos da manufatura, os fantasmas das vidas arrasadas pelo capitalismo industrial assombram a cidade criando ressentimentos políticos, sendo que a situação só piorou com a desindustrialização. Mas esse post explicando isso aí vai ficar para outro dia, hehe.

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